sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Reticências

...eu vou morrer de amor;

Ela disse que eu vou morrer de amor e eu ando acreditando nisso. Mais do que morrer, simplesmente; vou amar incansavelmente até o fim de todas as minhas possíveis vidas. Serei eterno amante e preciso conformar-me com tal ideia.

...as pessoas não escutam;

Ou pelo menos fingem que não escutam. Talvez nada compreendam e, por isso, não evoluam o raciocínio. Quando paro para pensar no que dizer, penso estar sendo completamente inadequado. Aliás, que palavra bonita essa, inadequado. Adoro essa palavra, muito mais do que adoro adequado, que soa sem qualquer graça. Enfim, se eu paro para pensar no que dizer, acredito não agir de acordo com aquilo que sou, e isso é - para não dizer terrível - um tanto assustador.

...o tempo passa sem dó...;

E quando nos damos conta, três horas inteiras fogem em vinte minutos! É incrível como esse sujeito pode nos enganar tão facilmente. Um piscar de olhos e voilá! A noite amanhece, a manhã entardece, a tarde anoitece e os minutos teimam em voar; e voam, e voam, e voam...

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Inversa

Primeiro escolheu o amor

Do amor, puxou
Um beijo!

Rasgou o fio do desejo...
Vestiu-se de paixão;

Ela é inversa, gosta
De gostar na contramão;

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Crônica Para Uma Futura Internação

Não sei falar de outra coisa, desculpem-me. Sinto parecer um tanto quanto ultrapassado, batido, demasiado clichê, mas não, não sei falar de outra coisa. Eu tento, procuro mudar o ponto de vista, abordar uma temática diferente, usar mecanismos de fuga do padrão, mas não, não consigo falar de outra coisa.

Pode soar estranho tudo isso que agora vos digo, mas é muito isso. Caí em mim e dei-me conta de que não há outro assunto, outro papo. É sempre o mesmo, de maneiras distintas, em contextos diversos, porém, sempre a mesma coisa, o mesmo blá blá blá ao qual todos estão acostumados. Preciso encontrar um jeito de alterar a forma com que lido com essa situação, mas não, como não sei falar de outra coisa, acabo tornando sempre ao comum de meus escritos.

Adoraria falar disso e daquilo, adoraria falar qualquer coisa que não fosse o que rotineiramente digo e repito. Esse mais do mesmo que norteia meu fluxo cerebral para a mesma direção, todas as vezes que penso em botar no papel algumas das ideias que surgem em minha cabeça. Não sei ser diferente de mim mesmo, não sei ser outro, não sei ser como vocês gostariam que eu fosse. Não sei atender às minhas próprias expectativas, não, não sei falar de outra coisa e necessito urgentemente de uma válvula de escape.

Talvez queimar todo o papel do mundo e fingir não reconhecer a tinta de uma caneta quando estiver diante de uma. Isso é muito mais difícil do que eu imaginava, mas não tão difícil quanto mudar o discurso, trocar a fita, se é que vocês me entendem (¿!).

Percebam, o caso é digno de tratamento psiquiátrico, distúrbio psico-repetitivo, como se não existissem maiores possibilidades, demais horizontes. Sempre volto meus anseios e toda a minha loucura para um ponto entre milhões. Como se não pudesse fazer o contrário, como se algo me impedisse.

Internem-me numa clínica qualquer, eu simplesmente não consigo falar sobre outra coisa que não o amor. 

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Sem Título

Tinha um cara na rua

Na tua rua;
Na porta da tua casa

Flertando com
Os teus girassóis;

Fazendo afago
No teu gato persa;

Mas como tinha pressa,
Não ficou.


terça-feira, 13 de agosto de 2013

Vôo Noturno

A noite o chama para um passeio. Vestido com suas botas grossas e sua blusa de frio, ele caminha pelas ruas da cidade, que descansa. Pouca luz, ausência de ruídos, o contexto remete à solidão de um oásis em meio ao deserto. Apenas ouve o som dos próprios passos, enquanto pisoteia cascalhos e folhas, junto às velhas calçadas de pedras brutas.
...

O maço de cigarros funciona como orientação para futuras ações. Se há cigarro, há companhia. Numa noite desprovida de calor, se há cigarro, há um quê de presença. A brasa e a fumaça acalmam e acolhem ao seu coração solitário. Inconscientemente, ele compreende, que cada trago revela uma proximidade com o dia seguinte, o amanhã.
...

Olha para o céu e faz pequenas ligações, pontinho por pontinho, como que estivesse a desenhar com estrelas. Já que não pode alcançá-las, brinca, por alguns instantes, com a remota possibilidade de construir constelações partindo do amor. A lua, em forma de sorriso, parece acenar positivamente. Ele então sorri de volta, entorpecido.
...

O caderninho vai acumulando páginas e mais páginas de devaneios diversos. Frases tão soltas quanto a brisa do mar. Versos sobre amor platônico, traços sobre o papel em branco. Páginas coladas, que escodem segredos para a eternidade. Dentre tantas opções, ela escolhera o amor e rasgara o papelzinho.  Love, Love... And all she need is love.
...

Seus pensamentos migram como gaivotas. Voam para qualquer lugar sem fazer referência a qualquer hipótese de retorno. Vão e voam e somem no mundo. Lembranças de infância, ideias sobre o presente e uma boa dose de ansiedade pelo futuro, que reside nos segundos subsequentes. O tempo passa e ele nem se dá conta.

Já é dia.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Bolo Inglês

Provavelmente ela não se recorda da primeira vez em que nos vimos. Coisa rápida, fração imensurável de tempo. Milésimos de milésimos de segundos. Um olhar distante, despretensioso, algo muito comum para dois desconhecidos.

Como chegamos até aqui permanece uma incógnita. Caminhos que se cruzaram naturalmente, almas que se abraçaram com muita força, corações que se tiraram para dançar, ao fim de noites que poderiam se estender pela eternidade, de uma fração de segundo qualquer, como aquele, em que nos conectamos. Segundo o amor, é assim que tais coisas funcionam.

E o amor, este, ao qual partilhamos, é um oceano. Não por ser imenso, ou por não ter fim. É questão de ser um lapso, de sentimento fácil, algo que simplesmente acontece, como uma onda. O amor, ao qual me refiro, não se planeja, nem dele muito se espera. Tem a ver com sensações, como as surpresas, os anseios e o frio na espinha.

Provavelmente ela não se recorda da primeira vez em que nos vimos, e admito, seria absurdo demais guardar tal lembrança. Um milionésimo de segundo, onde seus olhos encontraram os meus. Onde o sorriso saltou ao rosto, fazendo minhas bochechas passarem a um tom levemente avermelhado.

Pulso intenso, batimentos desenfreados, confusão mental e a respiração afetada por algo inexplicável.

Como o gelo de suas mãos ao tocar as minhas, enquanto assistimos a um filme qualquer. Gelo este, que derrete aos poucos, a cada toque, a cada beijo, a cada novo bom motivo para seguir adiante. A cada novo bom motivo para esquecer o frio e aquecer os pés debaixo das cobertas. A cada novo bom motivo para somente a observar enquanto cozinha seu bolo inglês.